Tycho Ottílio de Siqueira Machado
Especialidade:
Acadêmico Patrono
Cadeira: 39
Mini currículo:
Sentado
pela primeira vez, diante de uma banca examinadora de admissão ao ginásio,
conheci ainda na minha infância, a figura ilustre do professor TYCHO OTTíLIO DE
SIQUEIRA MACHADO, que hoje tenho a honra de ter como Patrono da cadeira 39
desta insigne Academia.
Senhor
Presidente da Academia Fluminense de Medicina*, Senhores componentes da mesa, e
descendentes do professor OTTÍLIO MACHADO, minhas senhoras e meus senhores.
O
professor Ottílio Machado foi um dos grandes vultos do magistério, da ciência e
da medicina no nosso Estado e no Brasil.
Nasceu
no dia 10 de março de 1894 na cidade fluminense de Itaboraí, filho de Tycho
Brahe de Araújo Machado, oficial do nosso Exército e de Dona Áurea Julieta de
Siqueira Machado, professora primária.
Neto
por descendência paterna de Francisco Gomes Machado, que é homenageado por sua
carreira militar através da Rua Coronel Gomes Machado, em Niterói.
Iniciou
os seus estudos primários no Colégio Spencer em 1900; em 15 de setembro de 1905
matriculou-se no Colégio Abílio, atual Colégio Brasil, tendo prestado o seu
último exame naquele colégio no dia 17 dezembro de 1910, distinguindo-se sempre
por elevadas notas, sendo o primeiro da turma a diplomar-se Bacharel em Ciências
e Letras.
Ottílio
Machado era amante da música, tocava violão e deixou poesias de invulgar beleza e
lirismo como "Fonte de Água Viva", dedicada a seus filhos - "A Mulher" - "Prece" - "A Gota D´água"- "Encanamento" dedicada às suas filhas - "Anjo da Guarda" dedicada à sua querida mãe:
ANJO DA GUARDA
À MINHA MÃE
Quando teu filho aos braços
embalavas,
E adormecendo no teu seio vias,
Esquecendo as fadigas tu sorrias,
E sorrindo a teu filho tu cantavas
Quando seu sofrimento aliviavas,
Pelas noites de febre e de delírio,
Tu choravas sofrendo seu martírio,
E sofrendo com ele, tu rezavas.
Já vai bem longe o tempo em que
sorrindo,
Muitas vezes o pranto reprimindo,
EMBALAVAS NOS BRAÇOS TEU MENINO.
Mas ainda hoje, quando à noite deito,
Vejo-te Mãe, a beira do meu leito,
Como no tempo em que era Pequenino.
OTTILIO
16.03.1946
Demonstrando
o grande carinho e amor que dedicava à família.
No
período de 1911 a 1915 trabalhando como acadêmico nos serviços do professor
César da Fonseca no Hospital São João Batista em Niterói e Domingos de Góes, na
Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro; e auxiliar de laboratório, no
serviço do professor Alfredo Backer Filho; no Instituto de Proteção e
Assistência a Infância de Niterói conseguiu à custa de grandes esforços forjar
a sua grande mentalidade que depois distribuiria como benesses a milhares de
estudantes, ávidos para receber o seu saber.
Segundo
o professor Délio da Câmara Alemão, seu principal biógrafo e de onde tiramos a
parte principal deste trabalho, "o primeiro casamento de Ottílio Machado deve
ter sido um pródigo de estabilização emocional, logo seguido de uma catástrofe
brutal. Morre-lhe a esposa vítima na própria glória do parto. Num só instante
perde a companheira e o filho ansiosamente esperado, numa gestação feliz".
Passada a tormenta encontra em Dona Ondina, no seu 2º matrimônio, a companheira inseparável de toda a sua vida.
De seus filhos, dois formam-se em Medicina: Maria Eda Leite Machado, obstetra, medica do INPS, onde sobressai pela sua cultura, dedicação e amor ao próximo e Jose Ottilio Machado seguidor de seu ilustre pai, professor titular de Parasitologia na Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense e outras Faculdades
Ontem
seu pai, meu professor e meu amigo, hoje seu filho professor de meu filho,
ontem, eu admirador de seu pai, hoje, meu filho admirador de seu filho
Como
professor acompanhava os seu discípulos do Ginásio às Universidades,
transmitindo-lhes os ensinamentos com grande facilidade e simplicidade sem
deixar de ser severo e exigente. Este pendor pelas atividades didáticas que
deve ter herdado de sua mãe, começou em 1918 na Escola Normal de Passa Quatro, quando
ministrou o curso de História Natural. Atraído para o Magistério que, ao lado
de garantir o sustento da família, o realizava, também aceitou o lugar de médico
legista na Polícia Civil do antigo Estado do Rio.
Porém
o magistério o fascina. É professor de Física, Química e História Natural, no Colégio
Salesiano de Santa Rosa, de 1919 a 1926.
Classificou-se
no curso para professor de História Natural na Escola Normal de Niterói, em
1923. É nomeado em 31 de janeiro de 1926 Professor Catedrático de Ciências
Físicas e Naturais da escola profissional Washington Luiz (depois Escola do
Trabalho Henrique Lage).
Simultaneamente,
leciona História Natural no ginásio Bittencourt Silva de 1926 a 1947, quando
tive o prazer e a satisfação de ser seu discípulo. Lecionou no Colégio Brasil
de 1926 a 1935 e de 1940 a 1941.
Juntamente
com Antônio Pedro, César da Fonseca e Damaceno Vieira inicia os estudos e o planejamento
de uma Faculdade de Medicina para ter sede em Niterói. Após a fundação da Faculdade
Fluminense de Medicina, é investido como Professor Catedrático de Parasitologia.
Toma parte na Comissão de Finanças, em 1929. Em 1930, na Comissão de Inspetor
de Ensino. Em 1931 na Comissão do Patrimônio e membro do Conselho Técnico e
Administrativo.
Abre-se
o curso de Farmácia da Faculdade e é também investido na cadeira de Zoologia e
Parasitologia na função de Professor Catedrático de 1931 a 1937. Leciona no
curso de Vestibular da Faculdade de Medicina nas cadeiras de Física e História
Natural, no período de 1932 a 1934. Em 1934, exerce em comissão as funções de
professor na cadeira de Botânica Aplicada à Farmácia do curso de Farmácia da
Faculdade Fluminense de Medicina. Ocupa ainda o lugar de professor do curso
complementar do Liceu Nilo Peçanha de 1936 a 1937. Em 1936 retorna ao Conselho Técnico
e Administrativo da Faculdade Fluminense de Medicina eleito por unanimidade de
votos. Foi Diretor Substituto por várias vezes durante os anos de 1937, 1939,
1940, 1941, 1942, 1943, 1944, e 1945, sempre ocupando o cargo de Subdiretor. Em
1952 foi designado Diretor Substituto.
Editou
os seguintes livros para o curso secundário:
01.
Pontos de Zoologia (Escola Profissional do Colégio Salesiano de Niterói - 1929).
02.
Noções Sobre o Corpo Humano (Gráfica Brasil, Niterói - 1923).
03.
Elementos de Botânica (2 edições - Gráfica da Escolado Trabalho (1936).
04.
Elementos de Mineralogia (2 edições - Gráfica Brasil -1931).
05.
Pontos de Zoologia (1933)
Para
Curso Médico:
01.
Diagnóstico parasitológico - com 75 gravuras.
02.
Curso de Mycologia - 1937.
03.
Curso de Proto-Zoologia - 1938.
04.
Curso de Entomologia Médica - 1938.
05.
Curso de Helmintologia - 1939.
06.
Pontos Práticos de Parasitologia - 1940.
Organizou ainda os laboratórios de Ciências Naturais e os Museus nos Colégios: Salesiano, Santa Rosa, Escola Industrial Henrique Lage, Liceu Nilo Peçanha, Colégio Brasil, Colégio Bittencourt Silva.
Com a fundação do Instituto Vital Brazil
em 1939, é convidado a dirigir a parte de Zoologia Médica, onde trabalhou com
grandes vultos da pesquisa médica no Brasil, permanecendo aí até os seus
últimos dias.
Defendeu tese de doutoramento com o
trabalho "Diagnóstico da Febre Tifoide", perante a congregação da Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro, em 18 de dezembro de 1915.
Os seus principais trabalhos científicos
em 1923:
01. "Uma Praga do Feijão Thymelo Proteus
de Lineus" observação anotada no catálogo dos inseto que vivem na plantas do
Brasil, do professor Ângelo de Lima Costa;
02. "O Bicho-da-Seda no Brasil",
contribuindo para implantação do mesmo no Brasil contra interesses que tentavam
provar a impossibilidade de sua criação em nosso meio.
03. "Metamorfose dos Lepdópteros".
04. "Lepdópteros do Brasil".
05. "Deópteros do Brasil".
06. "Sinopse dos Insetos no Brasil".
07. "Hemópteros Membracídeos".
08. "Parasitismo entre os Insetos".
09. "Hemópteros do Brasil".
10. "O Stegomya e a Transmissão da Febre
Amarela".
11. "O Micuim, Flagelo dos Campos".
12. "Evolução das Larvas de
Trombidóides".
TEMOS AINDA AS MONOGRAFIAS:
01. "Sinopse da Classificação dos
Insetos".
02. "Mallophagos" (Sistemática e
Bibliografia).
03. "Mallophagos" (Espécies Principais e
Classificação)
04. "Anopluros".
05. "Hemipteros
06. "Siphonapteros" (em colaboração com
o professor Aníbal Pereira).
07. "Dipteros Hematóphagos".
08. "Tabanideos" (motucas).
09. "Culicídeos".
10. "Captura e Conservação de Insetos
para Coleção".
11. "Catálogo dos Insetos que Interessam
Medicina no Brasil".
Ottilio Machado não descansa, sua sede
de criar aumenta com os anos, e segue com outros trabalhos.
"Nota sobre a Hidra Verde: Microfotografia e Microprojeção"; "Biologia da Thumele Euricles (borboletas dos capinzais)"; "Contribuição ao Conhecimento da Biologia dos Lepdópteros do Brasil"; "As Lagartas da Urtiga"; "Simplificando a Técnica de Montagem das Asas de Insetos em Bálsamo"; "Trabalhos Práticos de Parasitologia" "Os Insetos Inimigos das Roseiras". É desta data a montagem da coleção de borboletas existentes na Baixada Fluminense, que foi oferecida ao Colégio Salesiano e posteriormente oferecida ao Papa, como presente do Brasil. De 1935 a 1938 se dedica mais à parasitologia médica, sendo desta época os seguintes trabalhos: "Sobre Dois Casos de Tyroglyphose Intestinal"; "Considerações Sobre a Isosporose Humana", que lhe valeu pela primeira vez a medalha de ouro "Prêmio Antônio Pedro" na Sociedade de Medicina e Cirurgia de Niterói.
"Estudo dos Flagelados Intestinais"; "Curiosa Anomalia em Proglote de Taenia Saginata"; "Notas Sobre Balantidioses"; "Controle Microscópico de Tratamento de todas Giardioses"; "Observações Relativas à Morfologia e Modo de Divisão das Giardias"; "Dois Casos (Giardiose Com Sintomas Apendiculares"
É contratado em 1937 pelo então
interventor do Estado do Rio de Janeiro Ernani do Amaral Peixoto, com
entomologista por indicação do Dr. Mário Pinotti, engaja de corpo e alma no
combate à malária juntamente com Olídio Sampaio Coelho e Carlos Novaes,
percorrendo o Estado à cata de larvas, ovos, ninfas e mosquitos, apresentando
um relatório que é um verdadeiro tratado de entomologia.
No primeiro Congresso Médico do Estado
do Rio, é relator do tema "Profilaxia e Tratamento da Malária" tendo suas
observações servido de modelo para a campanha implantada pelo Serviço Nacional da
Malária.
Sobre ofídios possui vários trabalhos
01. "Nota Sobre as Serpentes Venenosas
do Estado do Rio".
02. "Estudos Comparativos das Serpentes
do Brasil".
03. "Observações Sobre Ofídios do
Brasil".
04. "Variações de Desenho da Bothrops
Jararaca".
05. "Estudo Comparativo das Elapideas do
Brasil".
06. "Estudo Comparativo das Crotalídeas
do Brasil".
07. "Sobre a Existência e Frequência da
Surucucuting (Lacheseis mutuslins) no Estado do Rio".
Publicou ainda neste campo "Observações
Sobre Mordeduras das Escolopendras"; "Lagartas Tataranas"; "Acidentes
Produzidos pelas Medusas Caravelas e Actíneas".
Foi ainda Ottílio Machado quem, pela primeira
vez, notou a ocorrência da aranha "viúva negra" nas praias do Brasil, tendo
publicado o trabalho "Latrodectus Mactans; Sua Ocorrência no Brasil", que lhe
valeu outra medalha de ouro da Associação Médica Fluminense.
Certa vez um estudante, amigo do
professor Ottílio, às vésperas do vestibular, encontrava-se muito deprimido.
Tinha perdido uma irmã portadora de tuberculose dias antes.
O professor Ottilio a par do caso se
acercou do estudante sentado no bar da antiga Faculdade Fluminense de Medicina
para confortá-lo.
O estudante trazia um requerimento para
se inscrever no Vestibular de Odontologia.
Travou-se o seguinte diálogo:
O professor Ottílio Machado pergunta
surpreso:
- "Meu filho, você vai fazer o curso de
odontologia?".
E o estudante tenta explicar que várias
pessoas da família o achavam muito magro e fraco para aguentar o então puxado
curso médico.
O professor Ottílio pergunta novamente:
- "Mas afinal, o que você quer ser?...
Médico ou dentista?"
E o estudante responde: - "Médico!"
Então o professor Ottílio diz: - "Por
que você não segue Caio Martins?"
"O homem deve caminhar com as suas
próprias pernas, e nunca violentar a sua consciência".
O estudante rasgou o requerimento e
guardou dogma as palavras do mestre, para o resto da vida.
Talvez seja esta mais uma razão pela
qual o cirurgião que vos fala, tenha escolhido um professor de Parasitologia
para seu patrono.
Este estudante era eu.
Eis aqui em síntese o que foi a obra
deste grande mestre que soube ser simples na sua grandeza, deixando-nos um
legado que dificilmente .poderá ser atingido nos momentos atuais, apesar de
toda técnica moderna.
Faleceu no dia 14 de fevereiro de 1955,
vitimado enfarte do miocárdio.
* Hoje, Academia de Medicina do Estado do Rio de Janeiro-ACAMERJ.
Biografia escrita pelo Acadêmico Mário Simão Assaf.