Galdino do Valle Filho




Galdino do Valle Filho

Especialidade:

Acadêmico Patrono

Cadeira: 45

Patrono: destinado a Seção de Medicina Cirúrgica


Mini currículo:

Foi grande médico, o político-jornalista Dr. Galdino!

Desculpem-me os ouvintes.

Dicotomizar a vida desse Homem, implicaria desprezar facetas, outras, relevantes, de sua conduta, para fixar apenas uma delas. Significaria exaltar-lhe o cérebro, em detrimento do coração...

Impossível, pois, ignorarmos a coessência harmoniosa das qualidades do médico, que foi durante cinquenta anos, do político brilhante, do escritor inspirado. Nele, preciosos atributos se entrelaçaram e se confundiram de tal sorte que, dissociá-los, importaria descaracterizar a beleza da sua vida, diminuindo-lhe a estatura, reduzindo-lhe as cintilações imanentes do indivíduo superdotado.

Dr. Galdino foi bem sucedido em todos os padrões representativos: político que se notabilizou; médico proeminente; sonhador-objetivo - conceituação que o define como realizador perceptivo e humano.

O menino Galdino, descendente de barões, nasceu em 1879, na fazenda "Olaria", onde passou a infância. Fez os primeiros estudos em Friburgo, nos Colégios "Freeze" e "Anchieta". Em 1902 formou-se na Escola de Medicina do Rio de Janeiro. Teve como colegas de turma, além de outros, Arthur Neiva, Agenor Porto, Azevedo Amaral, Pinheiro Guimarães, Carlos Chagas, Alvaro Zamith.

Da cidade de Miraí, onde formou sua primeira Clínica, voltou a Friburgo. A esta altura, o médico já fora picado pela política... A empolgação política, porém robusteceu-lhe na popularidade do médico: corolário da simpatia cativante, da inteligência nitidamente de caráter social de que era dotado. Portador de forte magnetismo, Dr. Galdino tinha a personalidade de um comunicador inato!

A política levou o médico ao jornalismo. Em 1906, amainadas (temporariamente) as dissidências partidárias, fundou o "A Paz", semanário que, a partir de então, usaria como tribuna divulgadora de suas reivindicações.

Ao lírico enamorado das rosas, Friburgo deve um "Posto de Aclimação", numa antevidência do que tanto preocupa a. humanidade de hoje: o desequilíbrio ecológico e seus trágicos efeitos. É dele importante trabalho, intitulado "Aclimação de Animais do Brasil" - o que o fez precursor, ao inquietar-se com a preservação do meio-ambiente. Tais divulgações visam a ressaltar o caráter versátil do Médico que, em 1912, destacara-se além da esfera médica. Mas, convém lembrar: Dr. Galdino somente fechou as portas do seu consultório, nesta cidade, ao completar meio século de proficiente atividade, interrompida, apenas, quando esteve fora do Brasil.

Desta fase, não serão recordados todos os seus atos, mas farei referência a uma de suas luminosas campanhas - a que, pelo seu alcance, lhe deu o penhor de seus conterrâneos: a vitoriosa campanha para dotar Friburgo de energia elétrica suficiente para impulsionar suas fábricas de tecidos.

A Medicina jamais foi preterida. Não raras vezes surpreendemos o Dr. Galdino subordinando o prestígio alcançado na arte-política, à ciência de curar.

Não era tímido. Atirava-se, sempre que o interesse da coletividade pedisse atitudes definidas. Pessoalmente foi ao "Catete" pleitear junto ao Presidente Nilo Peçanha, em 1910, a instalação do "Sanatório Naval" em Friburgo. Amparado pelo seu prestígio, deu enfoque especial à Saúde Pública, à Higiene. Às medidas saneadoras, acrescente-se esta, de providencial alcance: a existência de "notificação compulsória" dos portadores de tuberculose que, em virtude da excelência do clima, em Friburgo procuravam a cura, expondo sadios à contaminação.

Sem dúvida, a atividade política sempre esteve ligada ao desempenho do profissional da medicina. O período de 1906 a 1922, quando morou em Friburgo, terá assinalado o mais atuante. Em 1918, participou da Missão Médica Brasileira que foi a guerra europeia. Em 1924, durante a rebelião paulista, seguiu com a Força Pública.

A partir de 1922 o nosso biografado desenvolveu brilhante atuação no Congresso Nacional. Destaco medidas de alcance social: prevenção contra tifo, alastrim, gripe espanhola - evitando possíveis hecatombes. Levemos em conta: nesta época o médico não dispunha de Casas de Saúde, automóvel, telefone, e que outros recursos de nosso presente... Dr. Galdino fez a medicina dos tempos difíceis...

Um caso pitoresco: Quando caminhava léguas, atendendo chamados fora da cidade, fazia-se acompanhar. Sua preferência recaía sobre algum exímio caçador que soubesse "piar" macuco e nhambu. Montado no seu tordilho Oyama, aparelhado com a sua "12", amenizava as distâncias com breves intervalos de caça... Isto  durou até 1920, quando recebeu da população friburguense que muito o amava, um "Ford", e várias latas de gasolina. Foi o primeiro carro a rodar por Friburgo

Outro caso verídico: Chamado ao Colégio "Anchieta", atendeu o LEONEL, adolescente franzino, portador de séria complicação a tornar sombrio o prognóstico de cura. Sondado pelo Tio, prescreveu que levasse, para sempre, vida calma, sugerindo a carreira eclesiástica para a vida futura. O tempo correu... Em 1941, recebeu um livro com esta dedicatória: "Ao Dr. Galdino do Valle, o Padre LEONEL FRANÇA, no limiar dos cinquenta anos, em agradecimento comovido ao médico escolhido pela Providência para a vida no vestíbulo da pré-adolescência".

Prognósticos como este, muitos deles se cumpriram. Mera intuição? Os seus êxitos na profissão marcaram época. Sua amizade ao povo, e a do povo ao seu médico, ignoravam barreiras. Entre este e aquele, estabelecera-se como que divina simbiose. Assim se explica seu invulgar prestígio junto aos clientes e amigos. Tão bem estruturado, não poderia Dr. Galdino alhear-se, ignorar as pulsações em torno dele. Mereceram sua atenção até mesmo os fenômenos metapsíquicos, embrionários como ciência, sempre olhados sob reserva, mormente àquele tempo. Em virtude de sua acuidade, de seu tirocínio, diziam-no dotado de "Clarividência"... É que, de mentalidade aberta, Dr. Galdino assimilava o devenir integrando-se aos ritmos do universo. Refiro-me aos fenômenos paranormais, já considerados para pesquisas, incorporados aos currículos das Universidades de alguns países desenvolvidos, e de outros insuspeitos, porque agnósticos.

Muitas outras histórias, algumas delas ligadas ao fantástico, fizeram a crônica diária desse médico friburguense inesquecível.

A falta de arquivo deixou-nos a vantagem do testemunho fidedigno de pessoas ligadas ao Dr. Galdino. Dentre outras, a do seu filho Afrânio, a quem devo especiais agradecimentos e antecipamos escusas, pois a simplicidade deste discurso não estará correspondendo ao gabarito do biografado.

GALDINO MARTINS DO VALLE - nome que usava quando, ainda estudante, cumpriu praxe acadêmica pouco observada: a defesa de tese. A dele versava sobre um tema que estava a empolgar os arraiais científicos, como assunto nascente: "PÂNCREAS E DIABETES". Para formalizar sua tese, nosso homenageado fez as experiências em laboratório improvisado, tendo sido acompanhado dentre outros, por Agenor Porto e Austregésilo.

Digno de registro: em 1950, na conferência pronunciada por Waldemar Berardinelli, Catedrático de Clínicas Médicas, o Ilustre conferencista citou Galdino do Valle - então Professor da Faculdade de Medicina - como precursor da nossa Endocrinologia Experimental.

Utilizando a política como instrumento, Galdino do Valle colocou seu prestígio à disposição do bem estar social. Turismo, Saúde Pública, Educação, Agricultura, Administração - setores autônomos entre si - ele os manipulou como se não lhe bastasse ao temperamento dinâmico ser apenas médico!

Em qualquer de suas múltiplas atividades, entretanto, nela o Médico se destacava, deixando-nos magníficos exemplos. Perante esta assistência não posso omitir uma de suas participações a fim de, neste solene momento, estender a homenagem da nossa gratidão ao Dr. Antônio Pedro. Reporto-me à luta pela fundação da "Escola Fluminense de Medicina", luta que valeu, ao meu Patrono, a honra de proferir a primeira aula - delicadeza dispensada ao Médico que se valera da política para abrir portas à juventude, aos futuros médicos fluminenses.

Dr. Galdino foi um lutador imbatível, merecedor de láureas.

Dissolvido o Congresso em 1937, o velho cacique voltou a enfrentar novo período de insegurança. Mas reergueu-se!... E, por ser assim, Friburgo não aceitou a maquete de estudo, encomendada ao grande escultor Honório Peçanha. O artista "viu" em Galdino do Valle o cientista. Imaginou-o sentado. Tal imagem, entretanto, não correspondia àquela entronizada no coração do povo, que sempre o via "de pé"!

Mas... em 1953, saúde precária, acometido de polinevrite, amparado por amigos, subiu ao palanque pela última vez. Com dignidade e desprendimento, despediu-se com esta frase: "A vida tem imperativos a que ninguém pode fugir".

É compreensível que Dr. Galdo seja mais lembrado pela sua atuação política. A tribuna dos Parlamentos, as colunas da Imprensa, o contato direto com as multidões constituem possantes geradores de comunicação, valiosos instrumentos de valoração do homem, junto a coletividade. São, tais veículos, instrumentos bem mais propiciadores de aplausos do que aqueles de que dispomos nós, os médicos... A presença do médico é antecedida pela penumbra da incerteza, é testemunhada, quase sempre, por uma plateia restrita, angustiada, por contingências mais atenta ao doente, sempre bem mais confiante em Deus do que no homem. Entretanto, para mim, e por muitos, ele foi bem mais que um político, foi um apóstolo da Medicina, quando ser Médico requeria renúncia, abnegação.

Continuaria falando... Apaixonante manancial de informações não me faltaria. Manancial que deixarei à disposição de quem se interesse por conhecer melhor a vida desse brasileiro de velha cepa. Conhecer melhor a um Homem-Integral, apaixonado pelas rosas, a quem não poderia faltar nem o dom do lirismo a perfumar-lhe a alma.

Dr. Galdino foi um artista. Deus criou para ele uma alma de Poeta!

Sim... alma de Poeta!

Dr. Galdino pertencia à "Academia Friburguense de Letras". Entretanto, mesmo no Homem-Poeta o Médico se evidencia bem mais do que em tudo o mais que haja sido, ao dizer:

 

"Muitas vezes senti o desalento

Na profissão tão árdua que abracei...

Quantas vezes sofri a grande lei

Da ingratidão seguir-se ao salvamento...

 

Meu coração, por fim, já sem lamento,

não mais buscou a paga ao que salvei:

Mais orgulhoso e nobre do que um rei,

Despreza o vil metal do esquecimento!"


Quis o destino criar alguns pontos de tangência entre a vida do Dr. Galdino e a minha! Ambos médicos, nascemos, ambos, na bela e querida cidade de Nova Friburgo, num dia 24 de setembro... E como se não bastassem estas coincidências, coube-me, nesta Academia, a insigne honra de ocupar a Cadeira da qual ele é o Ilustre Patrono.

Mas não sei fazer Política... Nem sou Poeta.

 

Biografia escrita pelo Acadêmico Othon de Assis Vieira da Silva.


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