César Cândido Pereira da Fonseca
Especialidade:
Acadêmico Patrono
Cadeira: 4
Patrono: destinado a Seção de Medicina Cirúrgica
Mini currículo:
O homem é como a erva e a vida do homem como a flor da erva, dizem os livros santos. Como a erva ele nasce e luta para viver, como a erva floresce e frutifica, como a erva fenece e se decompõe.
A vida do homem tem as glórias da flor e a duração efêmera das suas pétalas aveludadas. Ela também murcha e cai postada pelo sol.
É perfeita a comparação que a filosofia cristã emprega para mostrar ao homem, sob uma forma poética e suave, o sem razão dos seus orgulhos e das suas vaidades, o ridículo das suas avarezas, o despropósito dos seus ódios e ambições.
Mas a flor que viver em toda sua plenitude deixa um fruto e esse fruto com suas sementes é sua continuação no tempo e no espaço, é sua glória, porque é o produto da sua luta e do seu trabalho.
Felizes as ervas que viveram e deixaram na terra as sementes benéficas; felizes os homens que viveram deixando na terra os exemplos do bem, da honra, da caridade; essas sementes imortais, nascidas da alma, tesouros que quanto mais esbanjados mais avultam.
Sim, Cesar da Fonseca foi um desses felizes, que desaparecendo do mundo, levado pela morte, pôde deixar como semente o exemplo de uma vida votada ao bem e ao sacrifício.
Ele soube compreender a medicina como um sacerdócio e a cátedra como um púlpito de onde devia ensinar a um tempo só - ciência - ética - caridade.
Agora revive nesta Academia, patrono da cadeira número 04, que me cabe a honra insigne de ocupá-la, embora reconheça a distância que me separa do meu patrono.
Quem o conheceu em plena atividade no período em que exerceu a clínica, quem o conheceu como professor transmitindo a seus discípulos ciência e ética, quem o conheceu principalmente como homem honesto, dos mais honestos, bom, dos melhores, pode bem julgar o valor da sua inconfundível personalidade, e a importância da obra que sem os clarins da vaidade e sem o incentivo das ambições, conseguiu realizar.
Nasceu em Petrópolis, em 14 de março de 1873, de onde se afastou para cursar o ginásio Nacional, atual Colégio Pedro II, onde foi aluno destacado.
Ingressou na Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro onde terminou o curso satisfazendo as suas tendências profissionais, colando grau de doutor com a tese "Valor Clínico do Eletro-diagnóstico" aprovada com distinção em 14 de janeiro de 1897.
Recém formado partiu para São Paulo clinicando apenas um ano, regressando a Petrópolis onde permaneceu como médico do Hospital Santa Tereza durante aproximadamente dois anos.
Em 1900 passou a residir em Niterói, aqui exercendo a clínica durante 44 anos consecutivos, até o seu falecimento. Nos últimos dois anos de vida, já com a saúde minada pela enfermidade, praticamente abandonou a clínica, atendendo quando melhorava a antigos clientes seus amigos, o que fazia gratuitamente.
Só quem conheceu a clínica domiciliar de outros tempos, pode avaliar o que significa 44 anos consecutivos de clínica com as chamadas noturnas, as suas dificuldades de transporte antes da era dos automóveis, as sérias responsabilidades dos "médicos de família".
Suas atividades profissionais não se limitavam a clínica particular, exercendo também as atividades profissionais como médico legista interino, médico do Corpo de Bombeiros e de associações de Caridade como o "Instituto de Caridade Azamor", o Dispensário São Vicente de Paula, e o Asilo Santa Leopoldina.
Entrando a fazer parte do Hospital São João Batista aqui em Niterói, na enfermaria de Clínica Médica, revelou-se então outra faceta genial de Cesar da Fonseca - "a de professor". Frequentava nesta época o Hospital, um grupo de estudantes, que se agrupou em torno do mestre que se revelava.
Compunham este grupo José Aguiar Continentino, Roberto dos Santos, Galdino Travassos, Arídio Martins, Ottílio Machado, Beraldo Martins e outros, que a cada momento pediam ao chefe da enfermaria esclarecimentos dos casos clínicos, dos sintomas observados e particularidades do tratamento.
Realizou nesta ocasião seus primeiros cursos de Clínica Propedêutica, Clínica Médica, e de Terapêutica com a difícil "Arte de Formular" da medicina antiga.
Foi pois nesta época por volta de 1913, que despontou o mestre no exercício gratuito do magistério.
Em 1925 quando se cogitou de fundar a nossa Faculdade Fluminense de Medicina, foi Cesar da Fonseca dos primeiros a aceitar a ideia e trabalhar por ela.
Fundador da Faculdade, nela concentrou daí em diante grande parte de suas atividades, sendo catedrático de Patologia Médica até 1936, quando foi extinta a cadeira por reforma do currículo médico.
Em 1934 com a criação da Policlínica da Faculdade de Medicina passou a chefiar um dos ambulatórios de Clínica Médica onde tivemos a felicidade de trabalhar como interno. Neste período voltou Cesar da Fonseca a ministrar, gratuitamente, à noite, aulas de residência do nosso amigo e seu assistente Edgard Paulo Tavares, ministrando cursos de Propedêutica, Clínica Médica e Terapêutica sendo que dedicou particular atenção às cardiopatias.
Frequentavam o curso Luiz Botelho, Elmarto de Oliveira, Feliciano Benedito da Costa, Armando Maurício da Silva, Silvio Picanço, Armando Odebretch, Celso Dias Gomes, e onde também tivemos o privilégio de assistir as suas aulas, e como da vez primeira foi totalmente gratuito o curso que ministrou.
Acompanhei os últimos anos de catedrático e tomava parte em sua residência até alta madrugada no preparo das aulas que ia dar, consultando sua vasta biblioteca.
Manteve até a morte a austeridade no trajar, característica dos médicos antigos, não abandonando o chapéu arredondado na falta do chapéu côco, o terno escuro ao invés do fraque, os colarinhos e punhos duros e o indispensável colete com a corrente do relógio atravessando de bolso a bolso.
Na intimidade tinha temperamento jovial, gostava de anedotas e introduzia mesmo em coisas mais sérias por vezes irreverência de atitudes em que mostrava o brilho da sua inteligência.
Se o tempo permitisse alinharia uma vasta séries de piadas e definições jocosas de sua autoria.
Passo agora a enumerar as suas principais atividades científicas e profissionais.
01. Nasceu em 14 de março de 1873, em Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro. Filho de Luiz Antonio Pereira da Fonseca e Luiza Olinda Ortt da Fonseca
02. Bacharelou-se em Letras no Ginásio Nacional do Rio de janeiro - hoje Colégio Pedro II.
03. Recebeu o Grau de Doutor em Medicina, pela Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de janeiro, depois de defender Tese, em 14 de janeiro de 1897, sobre o "Valor Clínico do Eletro-Diagnóstico" (2ª Cadeira de Clínica Médica) tendo sido aprovado com distinção. A Tese foi defendida perante a Comissão composta dos Doutores Rocha Faria, Benicio de Abreu, Campos da Paz. F. Valadares e Marcio Nery.
04. Iniciou a Clínica em São Paulo. Depois foi para Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro, no Hospital Santa Tereza, gratuitamente, vindo em seguido para Niterói, onde clinicou por 49 anos.
05. Prestou serviços nas epidemias de peste bubônica, febre amarela e "gripe espanhola".
06. Médico adjunto do Hospital Santa Tereza, Petrópolis (1899), gratuitamente.
07. Médico adjunto do Hospital São João Batista, Niterói, gratuitamente.
08. Médico efetivo do Hospital São João Batista Niterói.
09. Diretor interino do Hospital São João Batista, Niterói, por 4 vezes, sendo 3 meses de cada vez.
10. Diretor efetivo do Hospital São João Batista durante 3 anos, cargo de que foi exonerado, a pedido, por ter sido o referido Hospital anexado à Diretoria de Higiene (de 1902 a 1928).
11. Médico interino da Companhia do Corpo de Bombeiros Municipais.
12. Médico legista, interino, em substituição ao efetivo por 5 vezes, gratuitamente.
13. Médico da Comissão Sanitária Municipal contra a febre amarela.
14. Médico Radiologista e Chefe da Clínica Médica do Hospital São João Batista, Niterói, tendo sido o fundador do Serviço de Radiologia e do Serviço de Ozonoterapia.
15. Médico do Asilo da Velhice, Niterói, 1932.
16. Membro e Presidente interino por 5 vezes, do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro, cargo gratuito, durante 12 anos, considerado "serviço relevante prestado à Nação"
17. Membro do Conselho de Saúde do Estado do Rio de Janeiro, gratuito, cargo que exerceu desde o início até a extinção do referido Conselho (1934).
18. Inspetor Sanitário Municipal. Já doente neste cargo, pediu aposentadoria em 1935, com 35 anos, 11 meses e 20 dias de serviços públicos ao Estado e Municípios de Petrópolis e Niterói. O Prefeito de então contou 30 anos de serviço, anulando arbitrariamente uma deliberação do Conselho Municipal sancionada pelo prefeito Vilanova Machado que lhe contara em dobro o tempo em que servira na Defesa contra a Febre Amarela. Por isso foi aposentado por "invalidez" quando apenas pediu aposentadoria por achar-se doente.
19. Tempo de serviço: 35 anos 11 meses e 20 dias sendo: 7 anos e meses ao estado, gratuitamente e 8 anos e meses aos Municípios de Petrópolis e Niterói, também gratuitamente.
20. Secretário da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro.
21. 2º Vice-Presidente da extinta Associação de Medicina e Cirurgia de Niterói.
22. Membro Honorário da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Niterói.
23. Diretor da Associação dos Funcionários Municipais, onde prestou serviços gratuitos.
24. Associação de Socorros Mútuos de Niterói, da qual foi Presidente.
25. Serviços profissionais a Cia. Cantareira; Enfermaria da Força Pública e Asilo Santa Leopoldina.
26. Professor de Clínica Médica e Obstetrícia. Médico do Dispensário São Vicente de Paula.
27. Foi um dos fundadores da Faculdade Fluminense de Medicina, onde exerceu a Cátedra de Patologia Médica.
28. Organizou a Biblioteca da Faculdade Fluminense de Medicina.
29. Honraria de Decano das Clínicas Fluminense.
TRABALHOS APRESENTADOS
- Paralisia Facial Traumática - Revista do Grêmio dos Internatos dos Hospitais - nº 3, 1894.
- Valor clínico do Eletro-diagnóstico - Tese de doutoramento, app. com distinção - 1896.
- Parecer sobre o Espéculo do Dr. Mello Barreto - Boletim da Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo - nº 28, 1897.
- Lithiase Pancreática - Anais da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro 1915 - 1916.
- Tratamento da Dysenteria Baciliar - Anais da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro - 1916.
- A Cura da Coqueluche pelo Ozona - Arquivos Brasileiros de Medicina nº 11 - 1917.
- O Syndromo Pancreáico de Marcha Crônica - Comunicação feita à Associação Médico Cirúrgica Fluminense - agosto de 1921.
- Alguns Casos de Angor Abdominalis - Comunicação feita à Associação Médico Cirúrgica Fluminense - setembro de 1921.
- Contribuição ao Estudo Clínico Terapêutico de Oclusão Intestinal - com prefácio de Miguel Couto - Imprensa Estadual - 1922.
- Aula Inaugural do Curso de Medicina "O Tempo Acadêmico" - junho de 1929.
- Contribuição à Patogenia do Pâncreas - Revista Fluminense de Medicina - nº 2 e 3 - 1937.
- Oração de homenagem à memória do Dr. Antonio Domingues de Sá, prestada na Sociedade de Medicina e Cirurgia de Niterói - Revista Fluminense de Medicina, outubro de 1940.
- Oração de despedida à Turma de Medicos de 1939 - Revista Fluminense de Medicina - janeiro 1940.
- Aula inaugural dos Cursos da Faculdade de Medicina em 1944 - Revista Fluminense de Medicina - outubro 1944.
- Electro-terapia clínica - livro que deixou incompleto, com a maior parte já datilografada.
Biografia escrita pelo Acad. Antonio Carlos de Souza Gomes Galvão.